terça-feira, 8 de maio de 2012

Afonso Vicente foi um grande monte da freguesia de Alcoutim [15]

NOTAS HISTÓRICAS SOLTAS

SANTO OFÍCIO

As garras desta instituição, de má memória, também se fez sentir nesta pequena povoação e é para nós a mais antiga referência documentada que conhecemos.

É julgado e condenado no Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Évora, o lavrador João Mestre que aqui residia, solteiro, natural de Cachopo então pertencente ao concelho de Alcoutim, filho de Joane Anes e de Leonor Mestre.

Foi preso em 10 de Novembro de 1656 (em Alcoutim existiam os Familiares do Santo Ofício a quem competia denunciar as situações), acusado da prática de judaísmo, heresia e apostasia (deserção da fé).

Foi sentenciado a 18 de Abril de 1660 a tormento, em auto de fé por não ter confessado as culpas, o que fez depois de ter passado pela Casa do Tormento.

É mandado cumprir degredo. (1)

CEMITÉRIO DA FREGUESIA


Em 1843 estando ainda por fazer o cemitério da Vila e sendo grave a situação, a Câmara prepara para o efeito uma sessão na Capela de Nª Sª da Conceição numa tentativa de resolver a situação, sendo convocado um representante de cada monte, excepto Balurcos e Cortes Pereiras que devido à sua dimensão foram representados por dois, tal como a vila.

O representante desta povoação foi José da Palma de que não conhecemos até agora mais nenhum dado.

Não sabemos como a escolha foi feita mas teria sido, certamente, em consonância com a população.

Além da Câmara, presidida por Paulo José Lopes, encontrava-se o Administrador do Concelho, António Joaquim Pinto, o Prior, António José Madeira de Freitas (tio) e o Ajudador desta vila, a Junta de Paróquia, constituída por Joaquim Madeira, José António Torres, António Joaquim Botelho e Pedro José Roiz.

A reunião teve lugar no dia 22 de Dezembro na Capela de Nª Sª da Conceição como planeado e foi positiva tendo sido acordada uma solução para o assunto.

Depois da explicação minuciosa e ponderada do Presidente da Câmara e tomando em conta a urgência de um tão transcendente negócio e os meios de pronto providenciar sobre o repouso legal e decente para os finados, se acordou unanimemente de fazer um cemitério em o sítio de S. Sebastião, ao sul da Ermida, pegado à mesma.

Para o cemitério se fazer era necessário concorrerem com a importância de 80$000 réis todos os fogos da freguesia, que no último lançamento ou rol da côngrua do Prior e Ajudador pagavam de 950 réis para cima, pagando cada um na proporção dos seus haveres.

Os trabalhos braçais seriam feitos pelos fogos que pagavam verba inferior àquela, entrando neste serviço o das cavalgaduras.

Deliberou-se também que os trabalhadores seriam dirigidos por uma comissão composta pelo Presidente da Câmara, Administrador do Concelho e Prior da Freguesia, à qual cumpria levar a efeito a feitura do dito cemitério o mais depressa possível, fazendo chamar para o serviço braçal ou habitantes competentes ou suas cavalgaduras, por turnos.

As verbas seriam arrecadadas por José Guerreiro, que para o efeito foi nomeado, competindo-lhe também mandar pagar os utensílios necessários e materiais, pagando aos pedreiros e mais jornais, dando depois conta de tudo.

Acordaram os participantes em nomear como olheiro da obra, José Gregório de Andrade, que era oficial de diligências da Câmara e que veio a falecer em Julho de 1844.

Ao habitante que não trabalhasse com assiduidade e cuidado no dia ou dias que lhe pertencessem seria tal trabalho considerado nulo.

Deliberou-se, finalmente, que de tudo fosse dado conhecimento ao Governador Civil, pedindo autorização para fazer a derrama e poder obrigar os trabalhadores a dar até três dias de trabalho. (2)


CHEIA GRANDE


A cheia do Guadiana de 1876 é conhecida no concelho de Alcoutim por cheia grande, pois foi de todas, que há memória, a maior acontecida.

Os prejuízos causados foram enormes e também atingiram moradores neste monte, pois ainda que uns quilómetros afastado, as pessoas não podiam prescindir de uma várzea no rio dado que se tornava um sustentáculo para a família, uma vez que as margens do Guadiana são os terrenos mais produtivos de toda a região.

Os que apresentaram relação dos seus prejuízos foram os seguintes: - Francisco Ribeiros, 90 mil réis (3), Francisco Bento, Vº, 38$000, José Lourenço, José Thomaz e António Mestre Serras, 30$000 e Manuel Gomes, Vº, 21$000 e José Lourenço Borralho, 20$000. (4)

A calamidade que a cheia provocou deu origem à construção da estrada de Alcoutim até à aldeia do Pereiro, para assim possibilitar o ganha-pão de muitas famílias que ficaram na penúria.

Entre outras pessoas que nos referiram que os seus antepassados trabalharam na construção da estrada, lembramo-nos do Sr. António Patrício, vulgo António Pedro, de Afonso Vicente que nos dizia que a sua avó tinha trabalhado na construção da estrada.

Para auxílio da sementeira seguinte aportou um iate, como é designado, a Alcoutim carregado de sementes (trigo, cevada, aveia e fava) que foram distribuídas pelos lavradores mais necessitados e em que se incluíam os desta povoação, tendo sido para o efeito marcado determinado dia.

INCÊNDIO

Cerca da meia-noite do dia 3 de Maio de 1882 deflagrou um incêndio num palheiro cheio de palha pertencente a José Thomaz tendo ardido todo o seu conteúdo, não se suspeitando que tenha havido crime após efectuadas as competentes diligências para esclarecimento do acontecido.

Na reconstrução do edifício foram aproveitados alguns paus para o telhado, pois o fogo só os queimou superficialmente, tendo sido apeados recentemente ficando um deles guardado para recordar o nefasto acontecimento. (5)

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NOTAS

(1) - Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Évora, proc. 8469

(2) – “O cemitério da Vila de Alcoutim – da origem aos nossos dias”, José Varzeano, Jornal do Algarve de 10 e 17 de Março de 1988.

(3) – Um dos maiores 40 contribuintes do concelho.

(4) – Acta da Sessão da C.M.A. de 24 de Abril de 1877.

(5) – Ofício nº 41 de 8 de Maio de 1882 do Administrador do Concelho dirigido ao Governador Civil de Faro.