quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

À Francisca Rita

Pequena nota

Já aqui se tem referido várias vezes que o A.L. pretende ser o mais abrangente possível, na variedade de temas apresentados que apresenta numa maioria avassaladora sobre Alcoutim e o concelho, o que faz parte da sua matriz nas diferentes maneiras de escrever dos colaboradores, todos com características próprias e atrair o maior número de cidadãos possível, independentemente de serem ou não alcoutenejos.
Sabemos que chegamos aos quatro cantos do Mundo e temos recebido tipos de ligação muito diferentes, como já referimos algumas vezes.

Pensamos que o grande número de visitantes / leitores estará, pelas circunstâncias conhecidas, no escalão etário 30 / 60 anos, ainda que saibamos que temos honrosas excepções. O que não sabíamos é que apanharíamos a honrosa visita da Francisca com apenas dez aninhos!

Acabou por encontrar algo sobre o seu avô falecido há pouco tempo e ficou muito satisfeita, até porque soube coisas que desconhecia completamente. Não teve dúvidas em vir junto de nós perguntar se lhe podíamos dizer mais sobre ele.

Sensibilizado pela atitude da Francisca, pusemo-la em contacto com o nosso colaborador Gaspar Santos que na juventude foi amigo de seu avô quando os dois se encontravam em Alcoutim.

Rebuscando na sua privilegiada memória, Gaspar Santos enviou-lhe o texto que agora iremos publicar e que a Francisca muito agradeceu.

Como vêem caros leitores, o A.L. até chega às criancinhas.

Voltamos a agradecer à Francisca Rita o envio da foto do seu avô para ilustrar o texto.

Sempre que tenhas disponibilidade não deixes de visitar o ALCOUTIM LIVRE, onde podes encontrar algo do teu interesse, como aconteceu com a notícia sobre o teu avô.
Escreve sempre que queiras.


JV







Escreve


Gaspar Santos



[Cap. Marçal Luís Rita]

Conheci o teu avô Marçal Luís Rito no ano 1950. Ele era estudante na cidade e vinha a Alcoutim para casa dos pais só nas férias. O teu Avô e eu tínhamos então 17 anos de idade.

Alcoutim era uma Vila pequenina e hospitaleira. Teu Avô era um jovem simpático e com facilidade criou amizades entre os jovens que nessa altura eram muitos. Os primos dele, Joaquim Rita e Maria Silvéria que já ali moravam fizeram as apresentações. Os conhecimentos que o teu Avô trazia da cidade e de estudar, eram muito apreciados por nós alcoutenejos pois aprendíamos assim com ele.

Em Alcoutim havia poucos divertimentos. O teu Avô tinha bom contacto e com facilidade passou a ter os nossos divertimentos. Jogávamos à bola, ou ténis de mesa, conversávamos no Grupo Desportivo, e dançávamos durante noites especiais de festa em Alcoutim ou nas localidades próximas. Às vezes íamos dançar para a Vila espanhola de Sanlúcar no outro lado do Rio Guadiana.

O teu Avô como todos os jovens nessa idade gostava de fazer a sua partida. Vou contar-te um episódio que ele se calhar nunca te contou. Um grupo de amigos de que eu fazia parte tínhamos em preparação uma fritada de carne de porco. Isto era no mês de Dezembro já muito próximo do Natal. O teu Avô, às escondidas dos donos do petisco, deitou na fritada um picante muito forte e em muita quantidade. Nenhum de nós conhecia o chamado piripiri que alguém trouxera de África e lhe dera para pregar a partida. E nenhum de nós foi capaz de comer aquela ceia. Ficámos furiosos.

Soubemos quem tinha feito a brincadeira e pensámos também numa partida. Cada um de nós fez a sua proposta que foi sendo rejeitada. Até um que estudava em Coimbra e apreciava as praxes académicas lembrou: e se lhe cortássemos o cabelo. Houve logo aprovação total. E lá fomos nós à procura do teu Avô, e com uma grande tesoura demos duas ou três tesouradas na bonita cabeleira de que ele tinha muita vaidade.

O Professor Amaral que era na altura Presidente da Câmara procurou o grupo que fizera aquela partida ao teu Avô e deu-nos um grande sermão e fazendo-nos ver o tamanho daquela maldade. Acho que nos aconselhou a pedir-lhe desculpa e nós assim fizemos. Acho que o teu Avô deve ter sentido muito esta acção, mas também gostou do nosso arrependimento e desculpou-nos, mantendo a amizade para com todos nós.
O teu Avô está nesta fotografia que te mando. Ele está dum lado e eu estou do outro. Adivinha onde ele está. Vês como ele tem uma grande cabeleira. A fotografia é tirada nas Festas de Alcoutim em 1951.

[Grupo de jovens amigos em Alcoutim em meados do século passado. No último plano, o 1º da esquerda é Marçal Rita e o 1º da direita, Gaspar Santos]

A nossa convivência mais próxima deu-se até 1954. Nesse ano ambos viemos para o serviço militar. Depois, quando já nem o teu Avô nem eu estávamos em Alcoutim, os Pais dele mudaram de casa e passaram a morar na Rua das Flores mesmo em frente da casa de meus Pais. Tive notícias de que sempre se deram bem e gostaram da boa vizinhança dos teus Bisavós.

Depois de irmos para a tropa, poucas vezes nos vimos. Até que o senhor Agostinho que tinha uma loja na Rua Direita em Viseu e que é cunhado do meu filho Carlos me disse que conhecia o teu Avô e nos passamos a encontrar no Café sempre que eu ia a Viseu.

De vez em quando e em todos os Natais falávamos pelo telefone. Quando eu ia a Cinfães onde temos uma quinta, várias vezes o convidei para lá ir com a tua Avó. Tenho pena que ele, por uma ou outra razão, nunca nos tenha proporcionado esse convívio.

Gostei que tivesses contactado comigo e, acedi com o maior gosto, a recordar com saudade o convívio com o teu Avô. E eu e a Maria de Lurdes, minha mulher, mandamos cumprimentos para a tua Avó e Pais.

Para ti um grande beijo de Gaspar e Maria de Lurdes.