quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Gados

(PUBLICADO NO POVO ALGARVIO, DE TAVIRA, Nº 2083 DE 18 DE MAIO DE 1974)

Pequena nota
Apresentamos hoje nesta nossa rubrica um texto escrito pelo Prof. Trindade e Lima uma das poucas que da sua época escreveu algo sobre a sua terra.
Ainda que conheça infelizmente pouco daquilo que escreveu, aqui deixo este pequeno artigo publicado em “Pequenos Apontamentos”, o seu espaço no jornal regional.

JV





Escreve


Trindade e Lima



Foi no Largo do Carmo, no mesmo lugar onde há tempos encontrámos um doutor amigo com as guias do bigode alçando-se vitoriosas como flâmulas a bater ao vento, que agora encontrámos este homem do nosso concelho que por estas redondezas negoceia em gados que traz daquelas zonas. Falámos de coisas da nossa terra e referimo-nos à tristeza que por lá vai. Os homens válidos debandaram: uns para o estrangeiro, outros para os centros industriais onde a vida não mostra tão severa a sua carranca de madastra.

Era abundante em gado a nossa região, vindo nas estatísticas pecuárias entre as primeiras e parece-nos que até num ramo ocupava lugar primacial. Tinha fama o seu gado bovino muito apreciado e agenciado para enquadrar e conduzir os touros nas pastagens e nas praças tauromáquicas. Chamavam-lhe mertolengo mas alguns entendidos opinavam que se deveria chamar alcoutenejo por ser daqui a sua raiz. Não sabemos se ainda há por lá algum, mas supomos que muito pouco. Lembramo-nos ainda dos seus mercados muito frequentados e procurados por negociantes de fora.

[Retirado com a devida vénia de htt://www.cnpc.org.br]

Além do gado os trabalhos agrícolas estão pouco menos que extintos. Ultimamente a sua maior valia residia no cultivo da amendoeira, essa mesma condenada, pelo desenvolvimento da plantação de árvores industriais. Um nosso amigo aqui residente em Lisboa e que lá possui alguns bens vai mandar arrancar as amendoeiras de uma sua propriedade para proceder à plantação de eucaliptos.

E para amenizar a conversa com aquele nosso conterrâneo dissemos-lhe que o pai era da mesma incorporação militar que o José Lopes, o nomeado gigante de Farelos, tão cedo arrebatado à vida. Éramos ainda crianças quando eles, vindos à inspecção, se aboletaram na casa de nossos pais.

Assim nos iremos distraindo para que não seja só de amarguras a urdidura com que se entrelaçam os passos da existência.