quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Em Alcoutim: Outro interessante "desporto" à disposição dos jovens

(PUBLICADO NO JORNAL DO ALGARVE DE 14 DE JULHO DE 1973)







Escreve


Luís Cunha


[O castelo velho de Alcoutim visto do Guadiana]

À ordem natural das coisas, não podem assacar-se os vícios da injustiça e avareza na distribuição de benesses. E assim é que o completo isolamento que colocou os povos do interior do concelho de Alcoutim para lá de tudo, quase no fim do mundo, lhes deu, em contrapartida, um viver virtuoso, difícil de achar em qualquer outra parte. E só assim se entende também, que essa área de brenhas desérticas e condições sobre certos aspectos tão pouco atractivas, haja sido dotada de tão extraordinária faceta da ocultação de tesouros e encantamentos. Oferecendo-o à avidez de jovens aventureiros para a prática do desporto de caça de tesouros com detector portátil, falámos antes dos muitos que os guerrilhas deixaram enterrados pelas serras de Vaqueiros, Odeleite, possivelmente Cachopo e Ameixial.

Vejamos, de seguida, o que Alcoutim propõe para esse outro jovem, o romântico e imaginativo cavaleiro sulino que Cervantes tão genialmente pôs a errar a trote: para este, a tradição conta-nos algo de fabuloso e lendário fascínio.

Logo ali acima, mil e quinhentos metros a montante, o cerro do Castelo Velho ou “dos Mouros”, debruça-se sobre o rio; o cume não vai além de cento e cinquenta metros, mas as vertentes norte, sul e nascente, de rocha viva de xisto, descaem tão abruptamente que mal se pode caminhar por elas.


[O castelo velho de Alcoutim segundo Duarte de Armas, séc.XVI]
Terminado em bico agudo, tem lá no alto os socos quase desaparecidos dum pequeníssimo castelo que se diz mourisco mas cujas reduzidas dimensões e estranha configuração o tornam muito enigmático; castelo, simples casamata ou torre quadrada de 30 a 40 metros de lado, mal se pode imaginar empoleirada no bico daquela agulha, onde dá a sensação de ir desmoronar-se ao menor sopro.

A seu respeito, reza a lenda que uma enorme serpente de fartas sobrancelhas (encantamento de princesa moura), vem à meia-noite de S. João, estirar-se em duas azinheiras do barranco, à beira do caminho, solicitando o bravo cavaleiro que, deixando-se por ela beijar e abraçar, quebrará o encanto. A linda princesa e o fabuloso tesouro de jóias e pedrarias variadas que os subterrâneos do castelo ciosamente escondem, serão o justo prémio desse arrojo. E é grande a expectativa, porque não consta que o desencantamento se tenha dado até hoje.

Em fins do século passado ou princípios deste, apareceram em Alcoutim três árabes ou turcos, procurando o cerro da Cabeça do Cão. Como ninguém soubesse elucidá-los, desapareceram da vila, mas dias depois eram observados em pesquisas junto à foz do Vascão. Daí se foram, ao que parece sem encontrar o que procuravam.

A lenda acrescenta a este facto verídico, que os mouros que por séculos estagiaram pelas arribas do rio, por aí deixaram muitos outros tesouros enterrados, na esperança do regresso.

É mais uma “sobremesa” que Alcoutim oferece – esta agora só para jovens varonis, como é de ver.