quarta-feira, 24 de março de 2010

Os primórdios do ensino na Vila de Alcoutim

Ao cidadão espanhol, Carlos Vieira, descendente por linha colateral do Prof. Simão Vieira


[Rainha D. Maria II]
O ensino primário é instituído em Alcoutim no ano de 1840.

Por Mercê de D. Maria II, A Educadora, datada de 17 de Janeiro daquele ano e registada no liv.11, fl. 232 e 232 v. é passada Carta de Professor proprietário da Cadeira de Ensino Primário de Alcoutim, a Francisco José de Barros. (1)

Em 4 de Junho de 1851, por isso, onze anos depois aparece-nos um Francisco José de Barros, por Carta Régia, nomeado Sub-Director da Alfândega de Alcoutim, admitindo nós que se possa tratar da mesma pessoa, mas é difícil afirmá-lo já que por essas alturas havia com frequência nomes iguais, nem sempre distinguidos com Júnior ou Sénior.

Esta situação já nos tem levado a grandes confusões.

Em 1866 é rejeitada a criação de uma cadeira ou escola de Francês ou Inglês, princípios gerais de Administração Pública, Economia Política ou Industrial, atendendo à repugnância quase geral que se dá nos habitantes deste concelho relativamente à instrução.

Tal escola, a ser criada, ficaria sem alunos.







[O benemérito Conde de Ferreira]

Logo a seguir a Câmara não aceita também o legado de 1.200$000 réis do Conde Ferreira para o edifício escolar, alegando o fraco recurso do cofre Municipal, a pequenez da terra e diminuto número de alunos. O Governo Civil perfilha também esta opinião.

[Um dos primeiros locais onde funcionou a Escola Masculino]
Em 1873 a mesma autoridade faz sentir à Câmara a necessidade desta pedir a criação de uma escola primária para o sexo feminino no concelho. Analisado o assunto em Sessão de Câmara, esta acaba por aproveitar a ideia e deliberar solicitar a criação de uma escola de meninas nesta vila, oferecendo para o efeito, casa e mobília para a mesma. Para justificar o seu pedido, informa que a freguesia tem 2385 almas em 715 fogos, que existem nela 195 meninas entre os seis e os catorze anos e que a distância a que fica a escola mais próxima é de 30 km. Possivelmente referiam-se a Mértola ou a Vila Real de S.to António.

Em Sessão de 5 de Abril do ano seguinte, o vereador Torres declara que se apresentava um bom ensejo para obter casa para a escola de meninas que tinha sido criada no ano anterior e que ainda não tinha sido posta a concurso, nem se poria, enquanto a Câmara não mostrasse ter casa e os utensílios necessários. O Rev. Prior da freguesia (P. António José Madeira de Freitas, sobrinho) estava arranjando umas casas no Largo da Igreja e que tendo todo o empenho em que a escola fosse provida, não tem dúvidas em arranjá-la de modo a satisfazer os fins em vista. E é logo adiantada a renda de mil réis mensais.

[Local onde funcionou a 1ª Escola Feminina de Alcoutim]
A 12 de Novembro de 1874 já a escola para as meninas está pronta a funcionar, pois é enviado um auto de inspecção da mesma em que se declara a sua conformidade.

Este edifício já não existe e no testamento do seu proprietário é indicado como “casas nobres”. Foi derrubado depois de 1977 para um empreendimento turístico que nunca chegou a funcionar. Nesse local encontra-se hoje a Farmácia Caimoto.

A sala de aula tinha 5,85 m de comprimento por 3,85 de largura, sendo a altura de 3,37 m. Não era contudo, assoalhada. Em 1876 frequentada por 16 alunas e regida pela professora temporária, Teresa de Jesus Maria Almeida que tomou posse em 1 de Junho de 1875, inaugurando a escola.

A escola do sexo masculino, apesar de ter uma maior frequência, 19 alunos, era bem pequena. Funcionava nesta altura nos baixos da Câmara e era regida pelo professor, também temporário, António Simão Vieira.

Em 23 de Dezembro de 1875, o médico José Maria Alves Cardoso e outros cidadãos requerem a criação de uma escola nocturna para o ensino de adultos. Na Sessão de 14 do mês seguinte a Câmara limitou-se a louvar o pensamento dos requerentes.

[Capela de Sto. António onde funcionou provisoriamente a escola dos rapazes]
Devido à grande enchente do Guadiana em Dezembro, de 1876, a escola de meninas passou a funcionar “na casa que se poude arranjar” e a do sexo masculino não funcionava por ainda não estar pronta a Capela de S.to António, mas dentro de dois ou três dias se abrirá, segundo informa o Administrador do Concelho.

A escola masculina foi transferida da Capela de S.to António para uma casa situada na Rua do Esteiro, pertencente à viúva e filho de Paulo José Lopes, pagando-se de aluguer 1100 réis por mês. Contudo, o professor não aceita de bom grado a mudança, tendo-se gerado grande polémica.

O Administrador justifica-se perante o Governador Civil do seguinte modo: “Em tempo algum a Câmara contraiu obrigação de dar casa para escola. O respectivo professor fazia-a na sua residência. Como o novo mestre não tivesse casa capaz para o efeito, a Câmara cedeu uma térrea nos Paços do Concelho. A casa que agora alugou é melhor que a anterior e serviu já muitos anos de casa escolar no tempo do professor, Francisco de Barros.”

Dias depois, 31 de Agosto de 1877, o professor apresenta-se a requisitar as chaves e iniciar as aulas.

O prof. Vieira mostra-se um homem activo (não só na política) e oficia à Câmara expondo as grandes vantagens de se adoptar nas escolas o método de ensino de João de Deus. Apresenta um alvitre compatível, segundo ele, com os fracos recursos do Município, para o sobredito método poder difundir-se neste concelho. A Câmara mandaria a Faro um professor leccionar-se no dito sistema pois naquela cidade está pessoa habilitada oficialmente a fazê-lo. Depois, o referido professor viria ensinar os demais existentes no concelho.

A Câmara foi deixando o assunto de sessão para sessão e nunca mais resolveu.

O prof. Simão Vieira, de ideias republicanas, deixa de exercer funções em 21 de Fevereiro de 1884, certamente por pressões políticas e é substituído por Francisco Dias de Almeida. (2)

Em 28 de Junho de 1928 toma posse uma comissão administrativa das escolas, constituída por Manuel José da Trindade e Lima, professor, Dr. José Pedro Cunha, médico e José Ildefonso, comerciante.

[Edifício Escolar construído nos inícios do Estado Novo]
Pensamos que é por estas alturas que se constrói a escola da vila que serviu até aos inícios da década de setenta e que hoje alberga dependências dos serviços de obras da Câmara, Junta de Freguesia e no rés-do-chão os serviços de Tesouraria e de Águas do Município além do Posto de Turismo que ocupou a residência do professor após as devidas adaptações.

A Comissão Administrativa da Câmara Municipal nomeada pelo “Estado Novo” criou variadíssimos postos escolares espalhados por todo o concelho e alguns deles vieram a transformar-se em Escolas, mas este assunto não se insere neste trabalho.


NOTAS(1) – ANTT – PT-TT-RGM/h/200787 (Registo Geral das Mercês do Reinado de D. Maria II).
(2) – “ Um século de ensino escolar no concelho de Alcoutim (1840-1940)”, in Jornal do Algarve de 4 de ril de 1991.