segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Madeiras, pequeno monte na margem da ribeira de Odeleite



Nas nossas lides de escrevinhador, já abordámos, a nível individual, se a memória não nos falha, três montes da freguesia de Vaqueiros. O primeiro foi “A Capela de S. Bento e o Monte de Alcaria Queimada”, em 26 de Julho de 1990, no Jornal do Algarve (Magazine), o segundo já neste blogue, “Pão Duro, pequena povoação da freguesia de Vaqueiros”, em 19 de Novembro de 2008 e agora é o terceiro.

Saímos de Vaqueiros, sede de freguesia do monte que procuramos,rumando ao sul pela estrada 505. Ao primeiro cruzamento voltamos à direita e se percorrermos cerca de três quilómetros entramos na freguesia de Cachopo, mais propriamente chegamos ao monte de Amoreira.

Mas não é esse o nosso destino. Na estrada que estamos referindo podemos encontrar, para nós, uma das melhores vistas de todo o concelho de Alcoutim, que se espraia para o sul, numa imensidão que não se alcança.

Um pouco antes deste maravilhoso miradouro, encontramos à esquerda a estrada municipal nº 1049, hoje pavimentada o que não acontecia quando por lá passámos. É por ela e sempre a descer que vamos ao encontro do Monte das Madeiras. Na altura era ladeada por um esteval compacto. A inclinação acentuava-se. Uma curva apertada e ao fundo do vale da ribeira de Odeleite, lá está a pequena povoação.

Uma velhota guarda uma cabra à beira do caminho e um cão protege ambas. Placas indicativas de couto cinegético.

O monte situa-se junto à ribeira tendo a norte uma excelente várzea que se encontrava toda agricultada. As árvores eram poucas.

Agora que chegámos, salta-nos à vista uma boa vinha tratada e aramada como há anos era impossível ver.

Existia placa toponímica mas já em estado pouco perceptível. O decorrer dos anos foram-na deteriorando.

A estrada, do entroncamento até ao “monte”, deve ter cerca de quatro quilómetros.

A ribeira de Odeleite faz aqui impressionantes curvas para vencer as montanhas que pretendiam evitar o seu percurso, de tal forma que quase desaguava nela própria, depois de descrever uma curva de quase 360o!

É muito larga e quando a passámos tinha bastante água, ainda que a maior parte do leito estivesse de cascalho à vista que só será mexido no Inverno, na época pluviosa que provoca grandes ribeiradas já que o declive do terreno e a sua constituição geológica originam um rápido escoamento e os barrancos depressa engrossam, correndo céleres para as ribeiras.

Depois de contemplarmos o local foi fácil compreender porque o homem aí se instalou desde tempos recuados, já que perto se encontram vestígios de uma povoação islâmica. (1) É que o homem ali conseguia sobreviver, tinha água com abundância todo o ano, o que é fundamental para a vida, terrenos produtivos e facilidades de pastoreio.

Em 1771, Manuel Fernandes, da Das Madeiras, com se indica, fazia o seu manifesto de gado constituído por reses (gado bovino).

O telefone chegou em 1988 (2) e os arruamentos tiveram lugar em 1993. (3)

Para resolver o problema da passagem da ribeira, a Câmara, em fins de Setembro de 1988 concluiu um pontão que veio facilitar o acesso a várias povoações (4) e por onde passámos sem problemas.

Em 1758, segundo as Memórias Paroquiais, que constituem as respostas que os párocos deram ao questionário sobre as suas freguesias, indica como sendo povoação que “consta de três vizinhos”, ou seja, com três fogos e do termo de Alcoutim. Com igual número é indicado “Alcarias Galegas” que eu penso tratar-se do monte do Galego e que no século XIX era designado por Casa do Galego. Duvido que presentemente este monte tenha algum habitante permanente.

O “monte” foi sempre pequeno e em 1839, Silva Lopes não refere o seu número de fogos, tal como faz com outros de menor dimensão, referindo-o contudo como casal que confina com a freguesia de Cachopo. Reparar que o presidente da Câmara desse ano, é referido como das Madeiras para não se confundir com outro, do mesmo nome, mas da Fonte Zambujo e que era vereador na mesma altura.

No Censo Populacional de 1991, além da aldeia, aparecem designadas onze povoações com o seu número de habitantes, sendo neste grupo a menos habitada o Fortim, com 16. Estão contabilizados contudo e com a indicação de isolados, 243 habitantes nos quais se incluíram o deste monte. Presumo que o seu número fosse inferior a dezasseis visto ser o menor número apresentado.

Esta situação de habitantes isolados aparece em todas as freguesias do concelho mas é nesta em que o seu número é maior.

Segundo informação prestada por quem o conhece bem, o “monte” teria em 1998 seis ou sete fogos habitados, além de um ou outro emigrante que construiu habitação mas que ainda permanece no estrangeiro. É habitado, segundo aquele nosso informador por “caseiros” que exploram a Herdade do Barranco da Cerva que domina a povoação. Esta propriedade tem os seus senhorios que são vários, espalhados pela freguesia.

Em 21 de Janeiro de 1886 é feita nesta zona uma montaria aos lobos que devastam os gados em grande número e até aterrorizam os habitantes. O círculo vem fechar ao Barranco da Cerva, onde estará uma bandeira hasteada. (5)

O topónimo parece não oferecer grandes dúvidas. Madeira é ainda hoje um nome de família extremamente vulgar em Alcoutim, para não dizer em todo o Algarve, por onde se espalha. Eu conheci, em Alcoutim uma família deste apelido em que existiam quatro irmãs, que por acaso só uma casou e tendo as quatro uma vida muito ligada. Toda a gente as conhecia pelas Madeiras.

Pensamos que este topónimo terá tido uma origem semelhante e até tomando em consideração que foi e é uma zona rústica denominada por uma grande propriedade, o que impediu de certa maneira a fixação de mais pessoas.

No século passado a Família Gonçalves ou Gonçalves Teixeira (os apelidos confundem-se) dominava o “monte” e deviam ser os proprietários da falada herdade.

António Gonçalves ou António Gonçalves Teixeira, que presumimos ser a mesma pessoa, foi Presidente da Câmara de Alcoutim em 1839, no ano seguinte, Juiz de Paz de Vaqueiros, onde residia pelo menos em 1843 e vogal efectivo do Conselho Municipal. Por outro lado, Miguel Gonçalves, ou Miguel Gonçalves Teixeira, possivelmente da mesma família, foi Juiz Eleito de Vaqueiros, pelo menos em 1847, 1850, 1851 e 1858. Pertenceu igualmente à Junta de Paróquia de Vaqueiros em 1853/54 e foi também vogal efectivo ao Conselho Municipal.


NOTAS

(1) - Regulamento do Plano Director Municipal, Diário da República, I Série-B, Nº 285, de 12 de Dezembro de 1995.

(2)- Boletim Municipal nº 3, de Setembro de 1988.

(3)- Boletim Municipal nº 11, de Setembro de 1992.

(4)- Boletim Municipal nº 4, de Abril de 1989.

(5) “O lobo - devastador dos rebanhos alcoutenejos no século XIX”, José Varzeano, in O Distrito de Faro de Fevereiro de 1996.